O Sol ia alto. Já era meio dia. Um dia especialmente quente, e o grande astro castigava mais uma vez as pessoas miseráveis que viviam naquelas redondezas.
Rachaduras pelo chão. Um imenso deserto. Não havia verde ali, a não ser os olhos dela.
E a única água que ele viria até chegar a fazenda, eram as lágrimas que escorriam dos olhos dela.
A cena se repetia. Mais uma Raul iria tentar a sorte. Outro latinfúndio, outro coronel.
E Maria Dolores, ou Lola, como ele chamava carinhosamente a dona de seu coração, ficaria ali, parada na porta, ao lado de seus quatro filhos e o quinto, de seis meses, que estava na barriga ainda. Lucas, Maria Lúcia, Helena e Raulzinho. O quinto, se fosse menina, chamaria-se Rosa. E se fosse menino, Leonardo. Os pequeninos eram magrelos, só ossos. Alfabetizados graças a escolinha que frequentavam ali no sertão. Andavam dois quilometros, de barriga vazia até chegar na escolinha.
O dinheiro mal dava para se alimentarem, e Raul havia sido despedido do último emprego. Mas como era um bom vaqueiro e muito honesto, havia sido recomendado para um outro coronel.
Se a proposta fosse boa, e o coronel gostasse dos seus serviços, mudaria com a família para vila, nas proximidades da fazenda. Mas para quem vê os filhos e a mulher grávida passando fome, não para para pensar em propostas, o que vier, está de bom tamanho.
O coronel havia pedido dois meses de experiência, e Raul torcia para que Rosa ou Leonardo esperasse até o seu regresso.
Só de pensar em ficar longe dos filhos e de sua amada Lola, seu coração esfarelava-se.
Abraçou-a com todo amor que sentia.
" Só vou deixar você sozinha nesse estado, porque quando nosso bebê nascer quero dar a ele um bercinho."
Os olhos de Lola eram só lágrimas.
" Darei um jeito de mandar comida pra vocês, eu prometo. Nem que eu tenha que tirar do meu prato e caminhar até aqui todos os dias!"
Lola não respondia, conhecia o homem maravilhoso que tinha ao seu lado, o pai dedicado que era. E não adiantava pedir que não, pois se fosse preciso, ele o faria. Quantas vezes Raul não havia ido dormir sem comer nada, só para que ela pudesse comer.
Em toda sua dor pensava na vida miserável que levava, o que havia feito para aquele castigo tão cruel... Nenhuma mãe merecia mandar um filho dormir, para passar a fome. Mesmo em toda essa angústia, Lola rezava e pedia para que Deus lhe desse força. E Ele dava.
Raul abraçou os filhos, despediu-se deles com os olhos cheios de lágrimas. Aproximou-se de Lucas, o mais velho de nove anos.
" Cuide da sua mãe e de seus irmãos! Na minha ausência, você é o homem da casa! Você sabe onde guardo a espingarda e as munições, sabe como usá-la. Só se precisar muito... Use-a!"
Raul apertou o menino nos braços. Era tão novo, uma criança apenas. E já sabia atirar. Se um dia o pai faltasse, realmente, ele seria o homem da casa.
Lola enxugou as lágrimas, pegou nas mãos calejadas e sofridas de Raul e sorriu:
" Vá com Deus, meu amor. Rezaremos por você! Vai dar tudo certo, você vai ver! Minha Nossa Senhora da Rosa Mística vai proteger você! Não se preocupe, ficaremos bem. Jesus vela por nós!"
Raul beijou Lola ternamente. Abraçou-a e beijou sua barriga.
" Eu amo vocês."
Deu as costas sem olhar para trás, senão não conseguiria partir.
Lola e as crianças choravam, mas em seus olhos havia um brilho de esperança.
As quatro da tarde o ônibus que mudaria a vida daquela família passaria no ponto que Raul estaria esperando.
Acontece que ainda era uma hora da tarde.
quinta-feira, 2 de abril de 2009
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